À espera do Sol, de Michael Greenberg trata de um assunto muito delicado de forma não agressiva, que se você não ler atentamente, pode até não perceber exatamente a dimensão do problema.
Michael é um jornalista separado que vive com a nova companheira e sua filha caçula de 15 anos, Sally. Um um dia, de repente, Sally é trazida para casa por policiais que escondem as facas da casa: Sally havia tido um surto na rua e estava incomodando as pessoas. Era preciso esconder as facas pois Sally poderia fazer mal a si mesma.
Com Sally tendo se tornado agressiva verbalmente e falando coisas sem sentido e ofensivas, Michael a leva para um hospital psiquiátrico para descobrir o que está havendo. Qual é sua surpresa quando descobre que sua filha precisa ser internada por sofrer de Bipolaridade I ou psicose maníaco-depressiva. Esqueça as idéias românticas que tem sobre bipolaridade, como a mais facilmente difundida que bipolar é uma pessoa com alterações no humor e uma hora estou de bom humor e outra hora estou de mal humor. Para mim, bipolaridade era isso! Pelo que entendi no decorrer do livro, bipolaridade é quando a pessoa tem surtos, ou seja, as oscilações de humor são a ida e a volta à doença.
Nesse momento, toda a família questiona sua participação e responsabilidade no gatilho propulsor da doença de Sally: o irmão se pergunta se não implicou demais com a irmã, o pai se prestou pouca atenção a filha e a mãe se estava muito longe. Porém a doença de Sally é somente isso, uma doença e, apesar de ser uma doença na mente e as pessoas acharem que algo a causou, é uma doença biológica. Alguns fatos podem causar o primeiro surto, mas não a doença em si.
Continuo me fazendo a pergunta óbvia e inútil. Como isso foi acontecer? E por quê? As pessoas tem cancêr ou AIDS, mas são esquizofrênicas ou maníaco-depressivas, como se fossem atributos inatos do ser, parte do espectro humano, tão incuráveis quanto o temperamento ou a cor dos olhos de alguém. Como algo tão inerente podia ser uma doença tratável? E como alguém vencia essa doença sem anular a si mesmo?
Michael descreve a nova pessoa de Sally como alguém que sobrou quando a verdadeira Sally foi embora, expulsa por aquele ser que ficou no lugar dela, o ser doente. Ele conta como os remédios mudaram a personalidade da filha e como foi o período que ela viveu até voltar a ser a Sally de antes.
Os momentos em que ele conta como Sally tentava descrever como era viver dentro de sua doenaç são os melhores do livro.
-- Não vou conseguir passar por isso. Por que não aceitamos o fato de que a escola é algo com que não sei lidar?
-- Você já pensou na possibilidade de as coisas darem certo?
-- Possibilidades não me adiantam. Preciso saber.
-- Ninguém pode ter certeza do futuro.
-- Sim. Mas é diferente para mim. Se minha mente se volta contra mim, não vou nem saber que estou sendo uma aberração. Mas todo mundo vai saber.
Depois que o tratamento começa a se estabilizar e fazer seus efeitos, Sally consegue retornar a ser a pessoa que era antes, sua concentração volta, sua capacidade com a linguagem e outros sintomas colaterais provocados pelos remédios vão, aos poucos, indo embora. Ela percebe sua doença e como é preciso lutar contra ela, é como se ela estive em eterno combate com alguns de seus pensamentos, precisando saber distinguir quais são os pensamentos provocados pela doença e quais são realmente seus.
Michael é escritor e trabalha para jornais, então durante o texto, ele dá exemplos de escritores famosos que precisaram lidar com algum tipo de loucura na vida,seja com a loucura de parentes ou de si próprio.
No começo do livro, ele fala muito de James Joyce que tinha a filha com algum tipo de doença mental.
Joyce culpava a si mesmo impiedosamente pelos problemas da filha. Acreditava que Lucia era uma vítima de sua existência. Ele a havia arrastado por toda a Europa, vivendo em uma sucessão de pequenos apartamentos e hotéis, transformando-a em uma mulher sem idioma ou residência fixa - uma alma poliglota e sem raízes. Uma característica de sua psicose era a propensão a falar por neologismos e trocadilhos, que terminava como um balbuciar incompreensível, quase infantil. Ninguém entendia o que ela dizia. Exceto Joyce. Ele a escutava com atenção, respondendo com o máximo de seriedade e respeito, parecendo penetrar na dinâmica adulterada de sua mente com uma afinidade intuitiva que muitas vezes deixava os outros desnorteados e constrangidos.
É um ótimo livro para se conhecer um pouco mais desse universo e tentar entender como a doença funciona.
Nascido em Nova York, Michael Greenberg é colunista do Times Literary Supplement desde 2003. Seus artigos sobre ficção, crítica e viagem são publicados em vários veículos, entre eles O, The Oprah Magazine, The Village Voice e Boston Review. Mora em Nova York com a esposa e o filho.
Título: À espera do Sol
Autor: Michael Greenberg
Editora: Record
Ano: 2009
Páginas: 267
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* Este livro está substituindo o livro Réquiem para Monalisa que substituiu O vendedor de armas.
Olá!
ResponderExcluirAdorei a temática do livro! Ajuda as pessoas a saberem e conhecerem melhor as doenças psíquicas, principalmente esta, que todo mundo confunde. Muito bom!
Abraços e sucesso!
Ei Dri!
ResponderExcluirEu trabalho com banco de dados da área médica e uma vez trabalhei com uma pesquisa envolvendo pacientes bipolares e realmente, eles tinham altos surtos. É uma doença bem difícil, né?!
O livro parece ser bacana. Legal esta coisa das outras pessoas refletirem sobre os atos, pensando que de alguma forma poderiam ter influenciado o diagnóstico.
Gostei!
Bjins querida =)
Adriana, um bom livro também para se conhecer mais sobre a doença, é o Ensaio Pessoal de Kay Redfield Jamison, "Um Mente Inquieta".É muito bom e abrangente, já que é um testemunho real. Beijos!
ResponderExcluirEi Dri,
ResponderExcluirQue livro forte, não conhecia. Não sei se tenho coragem para ler mas sei bem o que é esta doença.
bjoo
Amo liuvros assim, temas fortes e diferentes e que traz mais conhecimentos, a resenha ficou otima. E a dica é muito boa!
ResponderExcluirNunca tinha ouvido falar deste livro, mas parece ser interessante. Eu já quis ser psiquiatra, sabia? Já quis ser tanta coisa...rsrs. Mas acho q eu iria gostar de ler este livro.
ResponderExcluirBjo.